Autor: Joe Hill
Editora: Arqueiro (Cedido por parceria)
Comprar: Livraria Saraiva
Sinopse: Amaldiçoado - Ignatius Perrish sempre foi um homem bom. Tinha uma família unida e privilegiada, um irmão que era seu grande companheiro, um amigo inseparável e, muito cedo, conheceu Merrin, o amor de sua vida. Até que uma tragédia põe fim a toda essa felicidade: Merrin é estuprada e morta e ele passa a ser o principal suspeito. Embora não haja evidências que o incriminem, também não há nada que prove sua inocência. Todos na cidade acreditam que ele é um monstro. Um ano depois, Ig acorda de uma bebedeira com uma dor de cabeça infernal e chifres crescendo em suas têmporas. Além disso, descobre algo assustador: ao vê-lo, as pessoas não reagem com espanto e horror, como seria de esperar. Em vez disso, entram numa espécie de transe e revelam seus pecados mais inconfessáveis. Um médico, o padre, seus pais e até sua querida avó, ninguém está imune a Ig. E todos estão contra ele. Porém, a mais dolorosa das confissões é a de seu irmão, que sempre soube quem era o assassino de Merrin, mas não podia contar a verdade. Até agora. Sozinho, sem ter aonde ir ou a quem recorrer, Ig vai descobrir que, quando as pessoas que você ama lhe viram as costas e sua vida se torna um inferno, ser o diabo não é tão mau assim. Joe Hill, autor de A estrada da noite e Nosferatu, já foi aclamado como um dos principais novos nomes da ficção fantástica. Em Amaldiçoado, o sobrenatural é pano de fundo para uma história de amor e tragédia, de traição e vingança. Um livro envolvente, emocionante e cheio de suspense que nos leva a refletir: em matéria de maldade, quem é pior, o homem ou o diabo?
Sempre quis ler algo do Joe Hill. Já queria antes mesmo de saber que o cara era filho do King, e quando soube foi como se uma chuva de caramelos apetitosos caíssem do lado da fora da minha redoma literária. Acabei adiando a leitura porque nos últimos dois anos faço muito isso. Então me agarrei ao fato da Arqueiro ter relançado O Pacto, que era o livro dele que sempre me deixou curiosa, com outro título e com o Daniel na capa. Não gosto de capas de filmes, mas abro uma exceção para essa. O que não abri mão foi da troca de título. Até agora não entendi a mudança.
Nesse livro somos apresentados a Ignatius, mas conhecido por Ig, que perdeu a namorada algum tempo atrás na história de forma horrenda. Ela foi estuprada e assassinada depois de um briga feia entre eles, e todo mundo culpou Ig pela morte de Mirren. Ele só se livrou da cadeia durante as investigações porque tinha uma família poderosa.
Só que um dia ele acorda com uma puta ressaca e com chifres - isso mesmo, chifres! E vamos além disso... Ig acorda com o poder de fazer as pessoas revelarem seus segredos mais obscuros. Seus pecados íntimos e irreveláveis. Desse modo ele passa a encarar os tais chifres como o único modo de descobrir o assassino de Merrin, e se livrar do foço em que se enfiou desde que o seu grande amor morreu.
Eu não sei se esse foi o primeiro livro escrito por Joe Hill, mas tive a sensação de encontrar alguma imaturidade sutil em sua narrativa dentro dessa história. Como se as vezes ele perdesse o fio da meada do que estava contando. Repito que é algo muito discreto, e não atrapalha o entendimento do que se está lendo, mas possivelmente atrapalha o ritmo.
O livro é cheio de flashback para contar como Ig conheceu Merrin e seu círculo de amigos e familiares. Momentos importantes, de fato, mas que deixaram o livro um pouco cansativo. Essa coisa de voltar ao passado dentro da narrativa tem que ser muito bem feita ou você acaba perdendo o ápice do que se está lendo. E como esse livro é cheio de voltas ao tal passado, os picos são muito oscilantes e incomodam um pouco. Mas de fato a questão de ritmo é a única coisa que tenho do que reclamar na história.
A base filosófica em que o autor cria a trama é sensacional. Ele trabalha a bestialidade que existe dentro de cada um de uma maneira que você faz a ligação com o real, mesmo que tenha um cara de chifres como protagonista no livro. É aquela coisa de você pensar no que seria capaz de dizer ou fazer se não existissem condutas sociais a serem seguidas. Saca os sete pecados capitais? Foi lendo esse livro que percebi que eles nada mais são do que a base biológica dos seres humanos, mas que com o convívio social foi podado das pessoas. Isso é bom? Sim, lógico. Mas não podemos esquecer de quem somos no íntimo, e Amaldiçoados te entrega essa ideia de bandeja.
O autor bebeu de questões teológicas controversas para destrinchar sua história. Os personagens são muito bem trabalhados, o que torna o livro acessível ao nosso emocional. E quando o autor coloca embates religiosos dentro da narrativa com essas pessoas que parecem de verdade, você meio que se sente ao lado delas discutindo os mesmos temas que são comuns e paradoxais a nossa raça humana até hoje. Quando as pessoas dizem que religião e política não se discutem, é porque jamais vai existir um lado totalmente certo sobre o que se falar. São duas linhas importantes do desenvolvimento das pessoas como pertencentes a uma sociedade, portanto cada um tem um determinado ponto de vista para seguir em relação a essas palavras curtas e com tantos significados.
Joe Hill tem sacadas incríveis com esse livro. Ig é um condutor do certo e errado das pessoas ao redor dele. Um observador dos erros e acertos, e por isso temos uma sensação de que mesmo presente ele é onisciente. Como se fosse um anjo, ou realmente um demônio. O crescimento dele juntamente com a loucura dentro da trama nos faz questionar até que ponto é socialmente errado alguma coisa, mesmo que ela pareça tão certa dentro de cada um. É a dualidade do ser humano em sua forma mais primitiva. Como diz minha avó... Até o demônio um dia foi anjo. Claro que isso é uma questão de percepção religiosa. Não sou católica e não acredito em demônios com chifres e inferno de larvas, mas acredito que céu e inferno convivam dentro de cada um e que sejamos tentados por ambos o dia inteiro. Saca o lance dos desenhos onde tem um demônio em um ombro e um anjo em outro? É basicamente isso o que penso, só que sem tanta alegoria.
Quando se tira os problemas de questões narrativas do autor, você entende as outras tantas filosóficas. É um bom livro para debate em colégios, por exemplo. São livros como Amaldiçoado que nos coloca para pensar, e sempre tiramos uma reflexão de dentro dele.
Se eu fosse dar nota pela dialética que o autor tem com o leitor das ideias dele, então esse livro merecia até mais do que cinco estrelas. Mas estou aqui para falar de um livro como um todo, e ele pecou para mim em coisas pequenas e quase insignificantes, que acredito que tenha sido por pura imaturidade de escrita.
Recomendo muito a leitura dele. Aguentem firme os ápices de ritmo e tentem visualizar a coisa da filosofia e teologia dentro do livro. Aposto que vocês terminarão pensando justamente no que é certo ou errado.