Autor: Maria Valéria Rezende
Editora: Alfaguara
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Sinopse: “Quarenta dias no deserto, quarenta anos.” É o que diz (ou escreve) Alice, a narradora de Quarenta dias, romance magistral de Maria Valéria Rezende, ao anotar num caderno escolar pautado, com a imagem da boneca Barbie na capa, seu mergulho gradual em dias de desespero, perdida numa periferia empobrecida que ela não conhece, à procura de um rapaz que ela não sabe ao certo se existe.Alice é uma professora aposentada, que mantinha uma vida pacata em João Pessoa até ser obrigada pela filha a deixar tudo para trás e se mudar a Porto Alegre. Mas uma reviravolta familiar a deixa abandonada à própria sorte, numa cidade que lhe é estranha, e impossibilitada de voltar ao antigo lar. Ao saber que Cícero Araújo, filho de uma conhecida da Paraíba, desapareceu em algum lugar dali, ela se lança numa busca frenética, que a levará às raias da insanidade.
“Eu não contava mais horas nem dias”, escreve Alice em Quarenta dias, um relato emocional e profundo. “Guiavam-me o amanhecer e o entardecer, a chuva, o frio, o sol, a fome que se resolvia com qualquer coisa, não mais de dez reais por dia (...) Onde andaria o filho de Socorro?, a que bando estranho se havia juntado, em que praça ficara esquecido?”
Demorei a resenhar porque de fato esse é um daqueles livros difíceis de se falar. Saca quando você lê algo tão profundo que fica sem saber o que dizer e como dizer? Foi minha relação com esse livro.
Quarenta Dias vai contar a história de Alice, contada por ela para as páginas de um caderno da Barbie que ela salva de ir parar no lixo e vira seu confidente depois que sua filha tira ela do conforto da aposentadoria em João Pessoa para morar em Porto Alegre. A filha quer engravidar e deseja a mãe por perto para que não precise deixar o filho com babás e creches.
Algo acontece para desnortear mais ainda a mulher que já estava confusa e triste, e então Alice começa uma jornada de auto descobrimento muito difícil e dura. Pessoalmente eu não teria aguentado metade do que ela aguentou, porque é importante dizer que cada passo dessa jornada foi por opção dela.
Olha, foi um livro que me colocou para pensar na minha própria mãe, e de uma forma incômoda. Quando estou no trabalho, minha mãe fica com meus filhos. Foi depois de ler esse livro que parei para pensar se ela fica porque quer, ou porque não tem opção. Nunca a coloquei na parede, saca? Jamais fiz chantagem ou algo assim. Simplesmente estava implícito quando acabou minha licença maternidade que ela ficaria com ambos. Talvez ela não quisesse isso. Quisesse passar suas manhãs tomando sol na praia, assistindo Prision Break na Netflix. E agora corre atrás de menino, grita para menino tomar banho...
Os quarenta dias de Alice foi o grito de liberdade de que ela precisava, ainda que dolorido demais para mim. Por vezes me vi gritando com a personagem para que parasse com aquilo e voltasse para casa. Mas, para que? Uma casa vazia, um caderno da Barbie e uma diarista? Saca, penso que a gente valoriza algumas coisas que no final das contas não tem lógica alguma. São desnecessárias. E nem sempre o que é importante para mim, vai ser para você.
O que a filha de Alice faz com ela nesse livro me deixou puta de raiva dela. E como essa filha, existem muitas por ai, o que é muito triste. A pessoa rala a vida toda para que no final dela encoste a cabeça no travesseiro e faça o que tem vontade, mas o negócio da família é foda! Aquela coisa... se você não tem filhos, vai ter uma velhice sossegada, mas solitária. E se você os tem, vai ter uma velhice cheia de gente, mas que podem querer mandar em sua vida. Sacaram o quanto isso tudo é tenso? Ai ai!
O livro é de uma narrativa belíssima! A protagonista é uma maravilha de mulher, super cativante. O relacionamento que ela tem com esse caderno também é muito bom. Realmente conversa com ele, como se pudesse responder.
Se teve algo nessa história que me fez tirar estrela dela, foi o final em aberto. Entendo que a proposta dele não era nos dar uma resolução das várias problemáticas que apresenta, mas sim falar da jornada que cada ser humano enfrenta em busca dessas resoluções e que nem sempre chega a uma. Mas isso me incomodou nesse livro. Queria mais.
Mas não posso deixar de indicar. Belíssimo trabalho da autora!