Resenha de "A Pérola que Rompeu a Concha" ( Nadia Hashimi)

Título: A Perola que Rompeu a Concha
Autor: Nadia Hashimi
Editora: Arqueiro
Skoob: Adicionar

Sinopse: Filhas de um viciado em ópio, Rahima e suas irmãs raramente saem de casa ou vão à escola em meio ao governo opressor do Talibã. Sua única esperança é o antigo costume afegão do bacha posh, que permite à jovem Rahima vestir-se e ser tratada como um garoto até chegar à puberdade, ao período de se casar. Como menino, ela poderá frequentar a escola, ir ao mercado, correr pelas ruas e até sustentar a casa, experimentando um tipo de liberdade antes inimaginável e que vai transformá-la para sempre. Contudo, Rahima não é a primeira mulher da família a adotar esse costume tão singular. Um século antes, sua trisavó Shekiba, que ficou órfã devido a uma epidemia de cólera, salvou-se e construiu uma nova vida de maneira semelhante. A mudança deu início a uma jornada que a levou de uma existência de privações em uma vila rural à opulência do palácio do rei, na efervescente metrópole de Cabul. A pérola que rompeu a concha entrelaça as histórias dessas duas mulheres extraordinárias que, apesar de separadas pelo tempo e pela distância, compartilham a coragem e vão em busca dos mesmos sonhos. Uma comovente narrativa sobre impotência, destino e a busca pela liberdade de controlar os próprios caminhos.

É inevitável que quando eu leia um livro que tenha os muçulmanos como foco, eu vá me emocionar em algum momento, ou me rebelar no outro. De fato passei por isso tudo com A Pérola que rompeu a concha. A autora coloca em xeque a todo instante nossa boa vontade em aceitar a cultura dos personagens, porque ainda que seja rica em muita coisa, é altamente pobre no quesito social. 

Esse livro é narrado em dois momentos diferentes. De tempos históricos diferentes e com protagonistas diferentes. A versão do passado é narrada por Shekiba, e a do presente por Rahima. Uma é trineta da outra. 

Com Shekiba vamos acompanhar como a vida dela começou difícil, sofrendo uma séria queimadura quando criança que deformou seu rosto, e como os familiares rejeitam a menina por ser uma garota e uma garota deformada. Ela vive despedidas dolorosas, e é passada de uma mão para outra como se fosse um objeto, o que de fato as mulheres eram  - e são  - nesses países. 

Com Rahima acompanhamos essencialmente o bacha posh, que é um costume afegão para quando as famílias só tem filhas mulheres. Uma delas pode se fazer de menino até que atinja a puberdade. É bem comum por aquelas bandas, e até onde pude entender, é tratado de forma altamente natural pelas pessoas. 

Shekiba também passou pelo bacha posh, mas de maneira diferente de Rahima. De início por necessidade e pela dor do pai, e depois porque jogaram isso como única opção para ela. Shekiba quer ter uma família, mas não consegue pela deformação. Rahima ainda quer correr pelas ruas vestido de menino, mas isso vai ter que mudar para ela mais rápido do que se imagina. 

Olha, esse é um livro indigesto. Porque na minha cabeça ocidental futurista não consigo aceitar que ainda existem situações que as mulheres não tenham punho para ter sua própria voz. Lendo A Pérola que Rompeu a concha percebi que isso não é apenas um costume antigo - nascer para servir e procriar - e a atualidade desse problema me corroeu durante toda a leitura. Para mim, é inaceitável que isso exista. É desumano. 

Saca um livro que causa falta de ar? Pois bem, é isso mesmo. Uma melancolia e uma tristeza sem fim. Foi difícil pra cacete terminar essa leitura, e não por ser um livro ruim, ao contrário disso, mas pela falta de esperança que ele causa. É difícil engolir que essas mulheres não podem pensar num futuro diferente para elas. Que só tem aquilo e acabou. E que aceitar esse nasib (destino) é a única coisa que podem fazer. 

Ainda que a mensagem final do livro seja de esperança de que as coisas estão mudando para melhor em relação a essas mulheres - vemos isso em muitas passagens do texto de Rahima, ainda é lento demais no meu ver. Ainda é doloroso demais de acompanhar. E ainda vou pensar várias vezes antes de começar a ler um livro sobre mulheres nessas condições deploráveis e humilhantes de vida. 

Então, Carol, é um bom livro? Sim, um livro maravilhoso, mas indigesto. Me fez pensar como nós, ocidentais, somos felizes por podermos escolher com quem casar, o que usar, o que não quer e lutar pelo o que quer. Acreditam que nem TV os maridos deixam elas verem? E sabem porque? Para não se iludirem com a vida que as mulheres do ocidente tem, porque nunca a delas vai ser igual. Ai que isso me dá uma puta raiva! Vontade de explodir todos esses homens, e não estou nem ai se essa é a cultura deles. Uma mulher tem direito a tudo! Todo mundo tem que ter os mesmos direitos, seja lá o que o Deus deles diz - ou o que eles interpretaram dele. 

Viram como foi um livro que me pegou de jeito, não é? Fiquei desolada com ele, mas apaixonada também. Foi libertador acompanhar a vida dessas duas mulheres em busca de um mundo melhor para elas. Recomendo esse livro com vontade. Difícil, mas essencial.