Resenha de "Um lugar chamado Liberdade" (Ken Follet)

Título: Um lugar chamado Liberdade
Autor: Ken Follet 
Editora: Arqueiro (Cedido por parceria)
Comprar: Livraria Saraiva

Sinopse: Um Lugar Chamado Liberdade - Escócia, 1766. Condenado à miséria e à escravidão nas brutais minas de carvão, Mack McAsh inveja os homens livres, mas nunca teve esperança de ser como eles. Até que um dia ele recebe a carta de um advogado londrino que lhe revela a ilegalidade da escravidão dos mineiros e um novo horizonte se abre aos seus olhos. Porém, para realizar seu sonho, Mack precisará enfrentar todo tipo de opressão das autoridades que não estão acostumadas a serem questionadas.Já na idealizada Londres, ele reencontra uma amiga de infância, Lizzie Hallim, agora casada com Jay Jamisson, membro da família que tanto o atormentara na Escócia. Lizzie não se conforma em viver submetida aos caprichos dos homens e constantemente escandaliza a sociedade com seu comportamento e suas ideias não convencionais. Quando Mack é acusado injustamente de um crime, ela quebra protocolos e sai em sua defesa, mas o amigo é deportado para a América.
Mack logo descobre que se trata de uma mera mudança de continente, não de ares sociais, pois a colônia também vive momentos de tensão: se na Inglaterra os trabalhadores não desejam mais ser explorados pela elite, ali os colonos preparam o caminho que os levará à independência do jugo inglês.Nesta saga repleta de suspense e paixão, Ken Follett delineia uma época de revoltas contra a injustiça com uma escrita enérgica e sedutora.

A primeira vez em que alguém me indicou um livro do Follet foi o da trilogia O Século. Claro que de início o tamanho do volume assustou, mas resolvi criar coragem para tê-lo na estante porque esse meu amigo que me indicou tem um gosto muito bom para livros. Tudo bem, tive Queda de Gigantes por algum tempo aqui parado, esperando minha coragem de começar a ler, mas ela não apareceu. Só que a Arqueiro é uma linda e teve a incrível previsão de que eu não conseguiria começar a ler Follet por um livro daquele tamanho, e me presenteou com o lançamento do maravilhoso Um Lugar Chamado Liberdade, que se tornou um dos meus livros prediletos da vida. 

O livro começa narrando um ponto de vista muito para frente do tempo onde a história principal é contada. Um cara achando algumas velharias enterradas no quintal da nova casa. É só um pequeno prólogo, mas dá uma ideia do que esperar do livro. Disso pulamos para conhecer Mack, um minerador que vive em uma das grandes fazendas de carvão na Escócia. Logo de início ficamos sabendo como são as coisas nesse lugar, e o que os mineradores passam para conseguir ao menos a comida do mês. É um regime de escravidão, mesmo que eles recebam por isso. Na verdade soa como um falso trabalho remunerado. 

Mack acaba descobrindo um certo dado importante sobre a questão da escravidão no país através de um advogado, e pretende contar para todos na mina. Com isso tem a intenção de tornar seus companheiros conhecedores dos seus deveres e direitos, e ter a liberdade que tanto planejava para si e a irmã. Só que Mack começa a mexer com coisas que não deve e pessoas importantes, e isso passa a se tornar um jogo de poderes maiores do que ele, mas não maiores do que o povo junto. 

De outro lado temos Lizzie, uma filha de donos de fazenda que está prestes a falir, e vê no casamento com um Jamisson uma chance de garantir que sua fazenda fique na família, e não seja cobrada como pagamento das dívidas. Jay Jamisson só quer o que lhe é de direito e o que o pai o nega. Por isso resolve se casar com Lizzie na intenção de cutucar uma ferida do velho, que são as fazendas dela. 

Contudo os caminhos de Mack e Lizzie estão sempre indo para o mesmo lugar, e a busca por liberdade passa a ser para ambos uma prioridade de vida. 

Eu fiquei completamente impressionada com o fato de Follet ser tão bom historiador quanto narrador ficcional. Ele inclui fatos importantes sobre a história da Escócia, Inglaterra e os Estados Unidos na época de colonização sem ser forçado. É natural o caminho para onde o enredo te conduz e te enche desses dados que certamente vão fazer você entender melhor como funcionavam as coisas. Penso que se escolas adotassem esse tipo de meio condutivo histórico para chegar até os alunos, as aulas seriam muito mais interativas. Eu certamente terminei de ler entendendo melhor sobre todo esse processo de colonização da América e escravidão branca na Escócia. Eu nem sabia que isso existia por lá na época! 

Os dois protagonistas, que acabam sendo três porque vemos muito do ponto de vista de Jay também, são incríveis! Mack é de longe um dos meus mocinhos prediletos na literatura. O filho da mãe tinha um condutor para problemas fantástico. Em cada canto onde Mack chegasse acaba se tornando uma espécie de líder do povo, justamente por conta da sua língua ferina e inquieta. Ele não sabia ficar calado para a injustiças, e realmente era muito com em conduzir levantes e greves. O tipo de pessoa que você respeita só em ver passar, e era apenas um jovem recém saído da adolescência. 

Lizzie também é uma moça admirável. Atira como nenhum homem, anda a cavalo como nenhuma dama e se comporta como nenhuma pessoa jamais vai se comportar em um livro. Ela tem a delicadeza de uma mulher doce, mas é capaz de se vestir de homem só para assistir as brigas clandestinas nos bares, ou ir a um enforcamento em praça pública na intenção de ver como são as coisas pelos olhos dos homens. É impulsiva e determinada, e tem um apreço enorme pela justiça. 

Jay no meu ver, apesar do viés de vilão, é muito mais vítima do descaso familiar do que um cara que acordou e resolveu botar para lascar com o mundo. Ele foi criado de uma forma e é bem difícil alguém conseguir sair ileso de algumas coisas. Claro que nós somos responsáveis pelos nossos atos! A visão de certo e errado é comum a praticamente qualquer ser humano. Mas o social influencia muito desse coisa do que se pode ou se deve fazer. Não vi um homem agindo por maldade, por mais idiota que fosse. Vi um homem agindo para provar que podia, e isso era tudo o que ele queria desde o princípio. 

O desenrolar da história é rápido e te prende absurdamente. Nas poucas páginas do livro o autor conseguiu inserir temas sensacionais e trabalhar na medida certa para não ficar cansativo. E nós passeamos entre vários países e levantes trabalhistas só para entender como esse sistema era nojento e desumano. As pessoas costumam dizer que o mundo está pior hoje em dia, e eu meio que discordo. Acho que o mundo sempre esteve ruim, só que naquela época não tínhamos TV para documentar e propagar isso. 

Aquelas pessoas trabalhavam de sol a sol. Crianças, velhos e mulheres carregando peso material e emocional em suas vidas para apenas sobreviver às custas de poderosos que não queriam saber se era justo ou não o que eles faziam. Enforcamentos como diversão, pessoas acorrentadas... Isso é tão ultrajante na minha cabeça que não consigo criar uma imagem fixa de algo assim acontecendo. E Follet soube trabalhar essas nuances delicadas de uma forma que te faz sentir o que ele queria que sentíssemos naquele momento. 

É uma história sobre liberdade nas suas mais variadas formas. Jay queria a liberdade de não sentir necessidade de provar ao pai que ele era tão seu filho quanto o irmão. Mack queria garantir que seu povo tivesse justiça em relação ao trabalho e meios de sobrevivência. Lizzie queria liberdade para fazer o que quisesse sem precisar de um marido para isso. Três pessoas em condições financeiras diferentes, mas que no final das contas queriam a mesma coisa. 

O autor deixa com esse livro a mensagem de que a liberdade nem sempre tem a ver com dinheiro. As vezes quem é rico é tão preso quanto muitos pobres. É uma questão de perspectiva, e que no final das contas nos mostra que todos queremos as mesmas coisas e lutamos pelo mesmo objetivo: Sermos livres.