Resenha de "Mar da Tranquilidade" (Katja Millay)


"Um dos melhores do ano"


Sinopse: Nastya Kashnikov foi privada daquilo que mais amava e perdeu sua voz e a própria identidade. Agora, dois anos e meio depois, ela se muda para outra cidade, determinada a manter seu passado em segredo e a não deixar ninguém se aproximar. Mas seus planos vão por água abaixo quando encontra um garoto que parece tão antissocial quanto ela. É como se Josh Bennett tivesse um campo de força ao seu redor. Ninguém se aproxima dele, e isso faz com que Nastya fique intrigada, inexplicavelmente atraída por ele.A história de Josh não é segredo para ninguém. Todas as pessoas que ele amou foram arrancadas prematuramente de sua vida. Agora, aos 17 anos, não restou ninguém. Quando o seu nome é sinônimo de morte, é natural que todos o deixem em paz. Todos menos seu melhor amigo e Nastya, que aos poucos vai se introduzindo em todos os aspectos de sua vida. À medida que a inegável atração entre os dois fica mais forte, Josh começa a questionar se algum dia descobrirá os segredos que Nastya esconde – ou se é isso mesmo que ele quer.Eleito um dos melhores livros de 2013 pelo School Library Journal, Mar da Tranquilidade é uma história rica e intensa, construída de forma magistral. Seus personagens parecem saltar do papel e, assim como na vida, ninguém é o que aparenta à primeira vista. Um livro bonito e poético sobre companheirismo, amizade e o milagre das segundas chances.

Mês passado estava fazendo um levantamento das minhas leituras do ano, procurando já os possíveis candidatos ao TOP 10. Percebi que não tinham muitos livros brigando pelo pódio, e isso me deixou meio desanimada. Gosto quando perco a cabeça tendo que escolher os melhores. E então minha alegria ressurgiu depois que li Mar da Tranquilidade, que foi um sopro de beleza no meu ano tão turvo de leituras "mais ou menos". 

Conhecemos Nastya, uma garota que de cara percebe-se que tem sérios problemas. Se veste como uma vadia, e não fala com ninguém há alguns anos. Se fechou no seu mundo para se livrar de uma situação traumática do passado, e permanece nele desde então. E do outro lado temos Josh, um cara que foi tão ferrado pela vida, e pela morte, que qualquer pessoa normal já teria enlouquecido, menos ele. 

E o que acontece quando duas pessoas ferradas se encontram? Bom, temos vários caminhos, mas no caso de Mar da Tranquilidade acontece o pensável, que é eles meio que se unirem, e o impensável, que é se afastarem um do outro quando se unir se torna íntimo demais. Tudo em poucas páginas de um livro que é cheio de altos e baixos incríveis e emocionalmente perturbáveis. 

Não vou dizer a você que é uma leitura fácil para uma tarde quente de verão. Mar da Tranquilidade é para ser lido quando você se sentir preparado psicologicamente para que o tem ai, portanto recomendo ler quando ninguém mais possa te atrapalhar e, se possível, sem barulho algum ao redor além da voz narrativa da autora, que toma forma através dos dois jovens. 

Confesso que achei o início da história meio confuso. Sabia que algo tinha acontecido à Nastya, mas não tínhamos pista do que ou como. Só víamos a garota andar pelos corredores da escola nova em roupas depravadas e ignorando a metade das pessoas. Foi com ela que fiquei pensando em como criamos capas para nos esconder das coisas que nos assustam. Nastya é uma personagem bem construída até nos pormenores da suas características mentais. 

E claro que temos o POV de Josh. Ele vem meio que para equilibrar a áurea pesada que é a garota. E não, ele não é um Oompa Loompa sorridente. Está mais para alguém que os outros ignoram por medo de quebrar um braço. Então você se pergunta como isso é um equilíbrio, e eu respondo que vocês precisam ler para entender. Enquanto Nastya corre até passar mal de tanto esforço, Josh lixa madeiras e constroi beleza de algo bruto. E foi mais ou menos o que ele fez com Nastya, lapidou uma garota ferrada e a transformou em uma menos ferrada. Pelo menos o suficiente para deixar alguém entrar no mundo particular dela. 

Josh foi, de longe, meu personagem predileto nesse livro. E não porque salva pessoas e vê o lado sarcástico de coisas que não deveriam ter lado nenhum além do horrível. Ele tem um humor negro que chega a ser chato. Não é um personagem para agradar o leitor, e aposto que a autora não está preocupada com isso. Ele é... neutro, essa é a palavra. Só que essa neutralidade do rapaz me deixou completamente encantada com o "foda-se o mundo" dele. Não é raivoso até que toquem em sua ferida, mas é mestre em expulsar as pessoas de perto dele. 

Na minha cabeça o forte desse livro são os personagens, e a ligação incrível que a autora cria entre os dois. Não é algo rápido e forçado. Na verdade você se pega torcendo para que Josh e Nastya comecem logo a perceber que são importantes um para o outro e parem de se comportar como pessoas tão ferradas para serem só adolescentes normais. Mas não existe nada de normal nos dois, e isso é visível desde o início até o fim da história. 

Não se tem um "happy end" quando o livro acaba. É mais uma sensação de que as coisas tem que ser assim, porque não dá para ser diferente. 

Os problemas de ambos não são do tipo que se resolvem, mas que se adaptam e vive-se mesmo assim. Eu curto cada pedaço desses dois, inclusive os pedaços ruins. Não digo que o enredo não é interessante, mas continuo afirmando que a grandiosidade de Mar da Tranquilidade está no que Katja Millay fez com essas duas pessoas. 

É comum, sabe? A autora pega coisas relativamente simples e transforma em um furacão Katrina nesse livro. E é compreensível. Quem pode julgar até onde a dor do outro é capaz de ir? Eu mesmo não sei lidar nem com as minhas, quem dirá dizer se alguém está sendo exagerado ou não! Como diz minha mãe, Deus dá o frio conforme o cobertor, mas isso não quer dizer que ainda assim não será frio. 

Eu terminei o livro pensando que ele de fato não era bonito por ser esteticamente bem feito, ele era bonito porque é psicologicamente imperfeito. Ele te derruba, ele te resgata e quando não sobra mais nada, ele te joga num mar de tranquilidade que beira a loucura. Como se você tivesse sido drogado e enxergasse estrelas em lugares longe de céus. 

Preciso dizer que estou apaixonada por esse livro? Preciso dizer que ele levou um pouco de mim quando me deu um pouco dele mais do que muitos outros que li na vida? Pois é, agora vocês já sabem. 

É um drama, e dos pesados. Portanto não leiam se estiverem afim de livros de verão. Aqui o clima vai do inverno gelado ao outono de renovações. Mas se enfim decidirem ler, venham com o coração aberto e seus medo de lado, ou Mar da tranquilidade fará eles se voltarem contra vocês.