Resenha de "Fahrenheit 451" (Ray Bradbury)






Sinopse: A obra de Bradbury descreve um governo totalitário, num futuro incerto mas próximo, que proíbe qualquer livro ou tipo de leitura, prevendo que o povo possa ficar instruído e se rebelar contra o status quo. Tudo é controlado e as pessoas só têm conhecimento dos fatos por aparelhos de TVs instaladas em suas casas ou em praças ao ar livre. O livro conta a história de Guy Montag, que no início tem prazer com sua profissão de bombeiro, cuja função nessa sociedade imune a incêndios é queimar livros e tudo que diga respeito à leitura. Quando Montag conhece Clarisse McClellan, uma menina de dezesseis anos que reflete sobre o mundo à sua volta e que o instiga a fazer o mesmo, ele percebe o quanto tem sido infeliz no seu relacionamento com a esposa, Mildred. Ele passa a se sentir incomodado com sua profissão e descontente com a autoridade e com os cidadãos. A partir daí, o protagonista tenta mudar a sociedade e encontrar sua felicidade.

Como uma grande amante de distópicos, eu sempre me sinto na necessidade de buscar os antepassados literários do gênero. Foi desse modo que acabei lendo Admirável Mundo Novo e Fahrenheit 451. É claro que os modernos seguem a mesma linha de sociedade distópica desses mais antigos, mas isso não quer dizer que você encontrará enredos parecidos. 

Nada de adolescentes como protagonistas e certamente nada de explosões com personagens revoltados da vida, pelo menos nesses dois que li. O negócio é tão bem articulado neles, que não existe uma visão completamente reformada dessas pessoas, o que vejo lógica. Afinal, são adultos que cresceram dentro de um sistema, e isso não se muda da noite para o dia. Então eles começam sim a se reformar, mas em doses homeopáticas, o que talvez nos deixe com uma sensação de lentidão em relação aos livros mais modernos. 

Esse vai contar a história do Guy, um bombeiro pacato que tem a incrível missão de queimar todos os livros. Sim, você leu direito. Nessa sociedade a função dos bombeiros não é apagar o fogo, mas começá-lo. 

Guy está de boa com sua vida. Tem uma esposa que segue o padrão exigido (frio pensar assim, né? Mas é como me sinto vendo ele descrever a mulher) , tem um emprego legal e vive seus dias com uma rotina pontual. 

Percebe-se nesse início que essa pontualidade na rotina dele chega a ser inquietante para o personagem, mas nada que o faça mudar de vida. Isso até bater um papo com sua vizinha adolescente que coloca um bocado de ideias questionadoras em sua cabeça e o enche de dúvidas sobre tudo. 

A partir desse momento Guy começa a pensar sobre o motivo dos livros serem  proibidos e fica curioso sobre o conteúdo deles, que faz muita gente preferir não viver sem, e que pelo visto pode mudar o rumo de como as coisas estão. 

O que mais instiga nessa distopia de Bradbury é a ideia central. Essa coisa dos bombeiros "apagando incêndios" sociais quando destroem livros. Existe uma poesia interessante nessa teoria, e achei um máximo a forma sutil com a qual o autor tratou. Guy faz seu trabalho como um lavador de pratos faria o dele. Sem questionar. Mas a partir do momento em que a garota levanta questões perturbadoras em sua cabeça, ele para e observa com mais calma o combustível do seu trabalho: os livros Existe um medo das pessoas por pequenos quadrados de papel, e me pego pensando em como nós veríamos os livros se não soubéssemos o real significado deles. Com medo, talvez. 

Vocês, leitores como eu, sabem que livros nos mandam para lugares mágicos, nos dão poderes de super heróis e até nos coloca em tronos. Se algo de tinta e papel pode fazer isso, imagina as ideias que ele coloca na cabeça de quem vive em uma sociedade de rotinas pontuais e pouco questionadoras. Como sempre digo, não dê conhecimento a um povo ou ele se voltará contra seus governantes. O conhecimento é a maior riqueza da sociedade. Então podem imaginar como é grande a responsabilidade que o autor dá ao livro nessa história. É como se eles fossem os protagonistas usando Guy para um bem maior. 

Não tive nenhum apego por Guy. Como disse, ele é um peão dentro desse jogo de poderes. Mas como o livro é pelo ponto de vista dele, não tem como não torcer. Até porque quando colocam o cara perto da esposa, ele passa a ser o Orlando Bloom vestido de pirata no seu sorriso mais sedutor. Ela é uma maluca psicótica que me deu vontade de enforcar. 

Sobre a sociedade, tudo o que sabemos dela é pelo o que Guy diz e passa, ou seja, poucas coisas. Não se tem uma visão ampla de como tudo aconteceu, a não ser, vagamente, por uma conversa que o chefe de Guy tem com ele. Mas daí é uma justificativa para algumas coisas, não uma explicação real dos fatos. Não sei se é porque estou acostumada com essas distopias modernas, que a maioria explica bacana o início, mas senti muita falta de detalhes sobre isso. Com o final que o livro tem, bem que Bradbury poderia ter escrito uma continuação. 

Diferente de Admirável Mundo Novo, as coisas aqui dão uma agitada perto do fim. Com direito a perseguição e tudo dentro de toda a filosofia contida nesse lance dos livros. Me senti assistindo O Livro de Eli. Sabe aquele filme do cara no meio do nada com um tesouro importante e tal? Pois é. Guy faz umas coisas malucas, e se mete em muita merda por isso. Nesse momento eu gostei mais dele.

É um livro muito bom, gente!
Em relação a sociedade, eu curto mais o conceito de Admirável Mundo Novo. Sobre a ideia do livro, prefiro esse. E o final dele me ganhou muito mais do que o anterior. 

A maioria das pessoas prefere o livro do Huxley como referência clássica distópica, eu curti mais o Bradbury. É leve de um jeito que não te deixa desistir dele por muito tempo. Passei um tempão lendo Admirável, e bem menos lendo Fahrenheit. Ainda me falta ler 1984 (que já está na estante) para eu poder ver qual dos três eu gamo mais, contudo por enquanto o ranking maior fica com esse aqui. 

Se você curte distopias, recomendo mesmo ler essas clássicas. São a base das modernas, e tem uma inteligência filosófica de fazer babar. Não costumam ser livros rápidos de ler, mas valem a pena cada página.