Resenha de " A Corrida de Escorpião"






"Um apanhador de lembranças belas"




A cada novembro, os cavalos d'água emergem do oceano e galopam na areia sob os penhascos de Thisby. E, a cada novembro, os homens capturam esses cavalos para uma corrida eletrizante e mortal. Alguns cavaleiros sobrevivem. Outros, não. Aos 19 anos, Sean Kendrick já foi quatro vezes campeão. Ele é um jovem de poucas palavras e, se tem medos, guarda-os bem escondidos, onde ninguém possa vê-los. Puck Connolly é uma novata nas Corridas de Escorpião. Ela nunca quis participar da competição, mas o destino não lhe deu muita escolha. Sean e Puck vão competir neste ano, e ambos têm mais a ganhar - ou a perder - do que jamais pensaram. Mas apenas um deles pode vencer. (SKOOB)
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Lembro-me do momento em que andei de cavalo pela primeira vez na minha vida: o balançado ritmado do animal e a minha completa falta de vocação para o serviço. O sol estava a pino, e ele suava em minhas mãos- não sabia que cavalos suavam. Meus seios doíam e meu estômago ameaçava devolver o almoço. Eu não conseguia alcançar o pé nos estribos e minha cela parecia sambar comigo em cima. Apesar do cavalo não ser grande, me senti insegura, indefesa. O trote era acompanhado por leves tropeços em terreno irregular. E quando ele tentou acelerou, eu pensei que cairia e ficaria muito envergonhada por isso. Eu não sabia como para-lo, não entendia de batidas rápidas nem de lugares específicos identificando o exato músculo que faria o animal ganhar vida ou estancar. Ele estava no comando, eu era apenas algo em cima dele.
O vento me chutou com destreza e eu sorri. Da dor que senti, da feição babaca que eu devia estar mostrando para os trabalhadores ao redor. Dessa vez ele conseguiu acelerar. Apesar de dor em todos os músculos, tinha descoberto uma forma de controlar sua direção e sua velocidade e de apoiar meus pés de uma forma que não me sentisse na Marques de Sapucaí. Ele respondia aos meus dizeres e juntos, suávamos em direção a um horizonte que eu não conhecia. Chegamos numa depressão de um terreno vizinho quando ele foi diminuindo. Me senti outra pessoa, envolvida em um cheiro de cavalo molhado, suada com o sol no rosto e dolorida por uma tarefa que nunca tinha concretizado além dos meus sonhos.
O cavalo se chamava Cavalo, e foi ele quem me mostrou o meu paraíso em forma de uma eletricidade que não lembrava que tinha. Eu estava viva!

Ler A Corrida do Escorpião me fez pensar em duas coisas que amo:
Andar à cavalo e Thiago Fernandes.
A primeira só fiz duas ou três vezes na vida, e foi amor a primeira cavalgada. E a segunda é um amigo/irmão que troca qualquer balada do mundo por alguns momentos de plantão cuidando de éguas a quem ele não chama de éguas: Todas têm nomes, sinais característicos e todas são amadas por ele. Muito amadas por ele.

O livro te faz viajar.
 A Maggie tem esse poder em mim quando escreve: ela me transporta para lembranças esquecidas.
Juro que conseguia ouvir o barulho do mar quando o livro falava disso, ou sentir o olhar de Corr quando estava provocante ou atento.

Não conhecia sobre lendas de cavalos d’agua. De figuras que surgem do mar e que são assassinas por instinto. Na minha cabeça, as figuras tão “mágicas” que a autora descrevia no livro já eram mágicas sem precisarem ter saído do mar.
Os cavalos em si detém uma magia sobrenatural em mim.
E a corrida passa a ser o que menos importa nesse livro, apesar de ser a temática dele.
Temos protagonistas perfeitos e personagens secundários que me dão raiva porque não havia pensado em escrever sobre eles antes.


A ilha, cenário do livro, fala. Sério!
A autora descreveu um lugar tão real e tão vivo em si, apesar de maçante e pequeno, que você se sente parte de tudo; comprando carne naquele açougue, ou objetos antigos naquela loja, ou ainda visitando aquele haras. Andando em carros quebrados ou dando comida a Dove, a égua de Puck.
Esse livro da Maggie respira. Seja pelos cavalos, pelos protagonistas ou simplesmente porque nada fica como você realmente pensa que vai ficar, e até isso é muito perfeito.
Já deu para notar que ele mexe total com todos os meus sentidos não é?


Os protagonistas são incríveis.
Temos Sean, um menino que viu o pai morrer na sua frente vítima de um capall uisce (cavalo d’agua) e que mesmo assim é criado num haras trabalhando com esses animais, que por incrível que pareça, ele ama. E toda sua volúpia de paixão é voltada para Corr, o garanhão vermelho que outrora tinha pertencido ao pai. Sean é silencioso; e não existe outra palavra melhor para identifica-lo. O personagem é muito bem construído, e mesmo que não abra a boca, para nos dar sinais de travessão no livro em muitos momentos, ele só fala a coisa certa, no momento certo, para a pessoa certa. E isso é tão Capall Uisce nele, que você pensa no fato dele ter crescido ao lado desses animais e ter se tornado parte deles.
A Puck é rebelde. É forte. Não é nem de longe parecida com qualquer mocinha de livro que tenha lido. Se Sean poupa palavras, ela usa todas, e não parecem erradas. Puck é a primeira mulher que se inscreve na corrida. E por isso, ela enfrentará muitos problemas de uma ilha machista. Ela ama a ilha, e a paixão dela se transforma na nossa.

Para quem interessar possa, a corrida é na verdade uma luta por sobrevivência. Tanto física: Capall Uisce são criaturas perigosas, e homens sedentos por vitória também são. Quanto psicológica, cada um ali tem um motivo muito forte e realmente necessário de estar correndo, mesmo que não seja muito benevolente.

Esse livro mexeu comigo porque me trouxe lembranças, porque a escrita dessa autora me deixa fascinada e apaixonada, e, sobretudo, porque vi como pessoas simples, vivendo coisas simples que possam se tornar tão perigosas e angustiantes, são tão comuns.

Devo citar que os personagens secundários são incríveis!
Seja Finn, e Gabe: Os irmãos de Puck que a deixou tão forte quanto possível depois da morte dos pais deles. Seja Peg e George Holly com seus dizeres pequenos e totalmente convenientes.
Parecia que cada personagem desse livro, e cada morador dessa ilha achasse um desperdício falar qualquer coisa que não tivesse importância. As pessoas deveriam tomar isso como exemplo.


O romance não é o principal dessa história, na verdade é um coadjuvante doce e que vem chegando pelas beiras. Nada meloso. Você não se sente incomodado por ele, e ele te cativa aos poucos. Nada de declarações de amor ao luar. Eles têm problemas demais para se preocupar antes de pensar nisso.

Devo dizer que o livro me cativou?
Acho que não precisa, não é?

Saiba que foi um dos livros mais belos que já li na minha vida.
Pela temática, pela construção e principalmente, pelo o que me fez sentir.
Cada livro bom que você ler vai te tocar em algum ponto, esse me tocou em vários, e não tenho mais nada para dizer sobre ele além de: Leiam! Agora! Já!